Viagem para o Titicaca e um hotel miserável

Acordei cedo para preparar a mochila. Rapidamente, depois de mais belo pequeno-almoço e de uma calorosa despedida de Yuri, da fabulosa Hospedagem Inka, desci as desmedidas escadas de San Blás para chegar á Plazoleta com o mesmo nome, onde me encontraria, segundo o combinado no dia anterior, com Javier. O Javier não estava. Apanhei outro táxi qualquer e fui directo ao terminal de autocarros. Paguei um sol para ter acesso ao autocarro e com o bilhete na mão preparei-me para embarcar.

O autocarro partiria às 8h em ponto. Pus a minha bagagem e subi. Outros tantos turistas estavam no mesmo autocarro. Os lugares da frente eram de luxo. Espaço para colocar os pés e para reclinar as cadeiras, umas fronhas das cadeiras mais lavadas que as outras e de cor cor-de-rosa davam outra qualidade ao espaço. Todos os turistas estavam nesses lugares. Eu,fui simpaticamente desviado para os lugares do fundo, onde estavam os peruanos. Excelente! Lugares apertados, onde as cadeiras não reclinam, estão manchados de nódoas e com espaços muito reduzidos. Não existem fronhas e os estofos estão furados pelas pontas dos cigarros apagados. Obviamente que na parte de trás é permitido fumar como eu, de janela aberta, pude comprovar. Como não sou propriamente grande não me importei nada.

O autocarro estava meio cheio ou meio vazio. Antes de partirmos algumas crianças entraram a vender doces, chocolates e garrafas de água. Os turistas mais abonados, ou com um maior sentimento de culpa, fizeram o favor de satisfazerem as suas necessidades mais básicas. Como não estava com fome, não sou abonado e, curiosamente, nestas situações não me ocorre qualquer sentimento de culpa não comprei nada. O autocarro partiu 10 minutos atrasado, logo com uma pontualidade britânica.

Fomos rumo a Puno, nas margens do Titicaca. A viagem duraria 6 horas segundo as previsões mais rigorosas dos empregados das oficinas de venda de bilhetes. Demorou 7, nada de anormal. De paragem em paragem, algumas mulheres ou crianças entravam para vender coisas para comer e beber. Uma mulher vendia fatias de bolo de laranja e chocolate e gelatina. Comprei uma gelatina de morango. Bem boa!

Numa das paragens saí para fumar um cigarro. Por trás de uma rede dezenas de mulheres gritavam pelos turistas para lhes venderem alguma coisa. Não podiam entrar no terminal rodoviário logo, faziam passar as coisas entre os buracos da rede. Pães amassados, garrafas de água estreitadas, bolos esmigalhados e tabletes de chocolate eram vendidos a preços mais modestos. A situação era completamente irreal. Dezenas de mulheres por trás de uma rede gritavam pelas pessoas que saíam do autocarro. Pareciam estar presas por detrás de uma grade e a serem carregadas num dos famosos vagões de transporte de massa humana nazis da segunda guerra mundial. A disputa pelo melhor turista criava brigas para usufruir do melhor buraco da rede. Não era uma coisa deste mundo. Sem qualquer ofensa, pareciam mesmo galinhas dentro de um galinheiro. Fiquei chocado com a imagem, nem tive coragem de a fotografar. Com este pensamento, antes de terminar o cigarro, entrei. Preferi acobardar-me e abandonar a situação. Senti-me francamente desconfortável. Mais uma vez, não comprei nada mas invadiu-me um sentido de culpa. Será que eu não poderia fazer nada para as coisas serem diferentes. Claro que podia mas, passados 5 minutos, esse espírito missionário, voluntarioso e solidário já me tinha abandonado a cabeça.

Continuava a viagem ao ritmo de Manu Chao ao som do meu Mini Disc (símbolo claro de um capitalismo insensível). A verdade é que para se viajar por estes países é necessário estar imunes a todas estas sensibilidades mais básicas. Senão, ficaria todos os 2 meses a ajudar a criança que estava na porta do aeroporto de Lima e que, ainda hoje, recordo. Temos de passar pelas situações sem as vivermos como nossas. Senão for assim, ou não vemos, ou na primeira esquina haverá alguém à espera da nossa ajuda. E na segunda também, e na terceira igualmente. Estes países são tão pobres que toda a nossa boa vontade não iria ajudar muito. Mas, a verdade é que dava um contributo substancial para a melhoria das condições mais básicas de algumas pessoas. No meu caso, de viajante solitário, saltimbanco errante e vagabundo por opção, o melhor é passar ao lado ou então viver as situações tão profundamente que me esqueço dos luxos que me esperam em casa. É bom sentir-me parte deles mas, na verdade, eu nunca serei um deles. Porque não quero e porque eles nunca me deixariam.

Ao ritmo do autocarro peruano, lento, com muitos solavancos e muitas paragens fomos seguindo ate Puno. Passamos Juliaca e começamos a ver, do nosso lado direito, a margem do famoso lago Titicaca. O Titicaca é o lago navegável mais alto do mundo. Está a 3.840 metros de altitude no meio dos Andes e é partilhado entre dois países: 60% peruano e 40% boliviano. É famoso pelas suas ilhas e pelo valor que, nos dias de hoje, ainda têm na cultura Inka. Duas das ilhas mais famosas, do lado Boliviano, são a ilha do Sol e a ilha da Lua. A ilha do Sol é o local onde se acredita ter nascido todo o império que há uns séculos atrás ocupou esta região. Do lado peruano, Amantani, onde irei dormir, Taquille, mais turística e por onde passarei só para visitar, e Uros.

Mas antes das ilhas, cheguei a Puno. Pouco antes de chegar, e como já é normal, um homem veio oferecer os seus serviços e do seu hotel a cada um dos turistas. Negociei um quarto barato com Fernando e um táxi partilhado com os outros turistas e fui convencido a pernoitar na Pousada Real. Num instante estávamos lá. Por detrás do balcão um homem com uma camisola preta justa e extremamente simpático.

O quarto era francamente mau. O pior de toda a viagem, sem dúvida nenhuma. Não era uma questão de a persiana não funcionar ou das tábuas da cama, para além de carunchosas estarem partidas de par em par. A questão é que era escuro, desagradável muito pouco acolhedor. Com uma janela virada para uma parede e no fundo de um corredor escuro. Com esta descrição nem me darei ao trabalho de falar da casa de banho. Repugnante, até para mim que não sou esquisito. Preferia que fosse “à caçador”, sempre é mais higiénico. No fim de tudo isto, aceitei. O objectivo de ficar sempre pelo mais barato tinha que continuar a ser cumprido, independentemente dos riscos a correr e das condições físicas do local. Deixei as coisas no quarto e parti rumo a Plaza de Armas, quatro quarteirões adiante.

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