Perito Moreno e preparação para o trekking

Ao cruzar a fronteira vi, mais uma vez, a quantidade de israelitas que viajam como eu. Só mais tarde é que me explicaram o porquê do fluxo de jovens viajantes de Jerusalém na América do sul (de língua espanhola): ao fazerem o serviço militar, o governo dá-lhes um ano “sabático” para viajarem e na América do sul são recebidos sem preconceitos e riscos, apesar de serem conhecidos por falar alto e serem pouco higiénicos. Tratei de não seguir o preconceito e conversei com os que iam no meu autocarro.

Atravessei a Argentina desde a Cordilheira até Rio Gallegos, no Atlântico. Tudo isto para voltar à cordilheira, mais ao sul (não há estrada directa), para chegar a El Calafate, a turística vila argentina de acesso ao Glaciar Perito Moreno. Atravessei a pampa onde estão muitas das petroleiras que fazem da Argentina uma potência. Esta e outras riquezas fazem dos países da América Latina, aparentemente “subdesenvolvidos”, os essenciais fornecedores de matéria-prima ao mundo industrializado. Esta constatação parece óbvia mas é mais impressionante no lugar: na Europa manejam dinheiro invisível mas grande parte da riqueza real, palpável, está aqui.

Fiquei a acampar em El Calafate para evitar os preços luxuosos de quem faz, em duas semanas, o triângulo Buenos Aires-Iguaçu-Perito Moreno. Não dormi nada, porque um grupo de Paulistas e Porteños (de Buenos Aires) conversou toda a noite num “Portiñol” perfeito, ao sabor de um (mau) vinho de Mendonza, sobre quais as melhores mulheres, os melhores clubes de futebol, as melhores cidades, os melhores países: Argentina ou Brasil? Às tantas, ouvi os brasileiros criticarem os portugueses por terem sido pouco espertos quando definiram o Tratado de Tordesilhas: deixaram a fatia grande para os Espanhóis, segundo eles. De dentro da tenda, não comentei. Lá consegui adormecer.

Com o tempo fui conhecendo essa extroversão e exaltação orgulhosa, que faz parte da personalidade dos Argentinos-Porteños e que conhecia mais dos Brasileiros… com uma anedota, que não deixa de ter o seu grau de preconceito, alguém mos apresentou muito bem: “a definição de ego, é um pequeno argentino que existe dentro de nós”. Além disso, os argentinos sabem muito bem “gozar” a vida e o país, são cultos, cultivam o bom gosto, dizem-se com uma costela italiana, as mulheres dizem-se as mais bonitas da América do sul, com mais pinta. E Buenos Aires é talvez a capital sul-americana mais próxima das europeias. Os argentinos da minha idade andam sempre com uma garrafa térmica e o mate atrás, para qualquer parte, seja Verão ou Inverno, amargo ou com laranja, qualquer bomba de gasolina dispõe a água quente para este costume.

Dormi poucas horas, só despertei bem diante do branco do Perito Moreno. É branco-azul-bebé, é uma maqueta em grande escala, como um mar ao qual puseram um “stop”, numa animação 3d. É comprido, vai mudando de cor ao longo do dia, deixa cair placas de gelo de vez em quando, e só o estrondo e a onda gerada o tira da imobilidade. É monumental! Vi a escala de uns exploradores que andam em cima dele. Aquilo que parecem fissuras pequenas na superfície superior, são buracos cavernosos, túneis azuis onde o homem não chega. O Perito Moreno é dos poucos glaciares do mundo que ainda se auto regenera, não está em retrocesso.

Perto daqui está também o Campo de Gelo do Sul, o Monte Fitz Roy, entre vários pontos atractivos. Estava eu a ponderar os meus orçamentos na rua de El Calafate, quando ouço falar Português: eram dois casais de idosos da Figueira da Foz. Parei e conversei. Eram bons viajantes, conheceram antes Valparaíso… despedi-me com dois beijinhos. Há muito tempo que não dava dois beijinhos. Dormi mais uma noite em El Calafate e desta vez ouço um dos Paulistas perguntar ao outro: “aquela gatinha da tenda ali deve ser argentina, né?”. Não sonhavam eles que a gatinha aqui falava o mesmo idioma que eles! Lá acabaram por se calar e eu consegui dormir em sossego.

Já sentia falta de casa, do Chile. Durante este tempo na Argentina algumas pessoas perguntaram-me se era chilena. O facto de ter aprendido a falar com chilenos, de conviver com eles diariamente e de já não falar frequentemente português, influenciou-me muito o sotaque. Entrei na XII Région de Magallanes y la Antartica Chilena. Cheguei a Puerto Natales com o objectivo de ir fazer o circuito das Torres del Paine, no parque que fica aqui perto. Tive sorte: um senhor ofereceu-me hostal ao sair do bus (foi a primeira e única noite em que paguei hostal num mês e meio a viajar). Era guia de montanha e aconselhou-me, excepcionalmente, para o trekking neste parque. Coincidência ou não, as dicas que ele me deu foram vitais para eu ir: mulher não pode carregar mais que 15 kg; a comida somos nós que a carregamos, portanto frutas desidratadas, frutos secos, cereais, muito chocolate; água é a que lá está; não se pode fazer fogo em nenhum ponto do parque; caminhar sempre cedinho (para se me acontecer algo, alguém passar depois e ajudar-me); não sair por nenhum motivo do circuito (e lê-lo bem, há partes onde deixa de se perceber o caminho). “Não há carros para te irem buscar uma vez dentro do parque. O meio mais rápido de transporte e acesso a um lugar é o cavalo”. Os refúgios mais distantes demoram 8 horas a alcançar a pé. “Podes apanhar muito calor e sol, neve, vento gelado, chuva e frio, todos juntos, ou cada um deles em diferentes partes do circuito, ou no mesmo dia. Só alguns refúgios têm água quente.” Manter ritmo respiratório, usar as mãos para subir em algumas partes, manter a força nos abdominais, tirar da mochila tudo o que não é estritamente necessário. Um só par de calças térmicas (lycra), uns calções, uma camisola e duas t-shirts, um boné, um casaco para chuva/neve e sapatilhas velhas. Tudo isto e muita força de vontade. “O “Puma” só aparece de vez em quando”.

Os preparativos já estavam, agora ia partir.

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