[box type=”info”]Este texto é uma cópia integral do prefácio que o Gonçalo Cadilhe amavelmente escreveu para o meu livro “O primeiro passo”.[/box]
Era o meu primeiro leitor a querer fazer o mesmo. A sua carta chegou a meio da minha volta ao mundo, pouco antes de embarcar no cargueiro que iria ligar a Nova Zelândia à China. E porque era o primeiro leitor a querer fazer o mesmo, entusiasmei-me. Assumi como uma questão pessoal a sua volta ao mundo. Afinal, era esse o fim último das crónicas que eu andava a publicar semanalmente no Expresso. Não era descrever a minha volta ao mundo, era partilhá-la. Era passá-la para outros, como um testemunho de maratona, como uma batata quente, como um bichinho carpinteiro contagioso.
Havia outra coisa. Uma espécie de “dejà vu” na direcção que a sua vida estava a tomar. Eu encontrava tantas semelhanças entre o que ele estava em vias de concretizar e o que eu tinha passado quando decidira “pôr–me a andar”, que a sua carta tinha-me feito reviver todos os meus sonhos, as minhas angústias, as minhas emoções desses tempos. Como eu, também ele tinha passado pela mesma universidade e saído de lá com o mesmo curso. Como eu, também ele se encontrava com um “optimus” emprego, que o resto dos seus colegas invejava. Como eu, também ele queria deixar tudo para tirar um “Master in Living”.
Respondi, portanto, à carta do André. Com muitos conselhos para a sua volta ao mundo. Que tipo de bilhetes de avião podia desfrutar, e quais os truques para os conseguir, e onde os comprar. Que tipos de pranchas levar, e como as embalar, e que ondas procurar. Conselhos sobre custos, dicas sobre economias de escala, transportes económicos, hotéis baratos, países a preço de saldo. Conselhos sobre a bagagem: o essencial e o supérfluo e o absolutamente dispensável. E sobretudo conselhos sobre a etiqueta do viajante: a humildade, a abertura de espírito, a dívida para com quem nos recebe, a gratidão para com a vida que nos é permitido viver.
Concluía a carta: “Esta vai ser a grande viagem da tua vida. Aproveita-a ao máximo. Surfa tudo o que puderes, conhece novas cidades, novos países atravessa as paisagens mais impressionantes do mundo, tira fotografias, faz amizades, conquista meninas, estende-te ao sol a ver os dias passar sem teres qualquer tipo de preocupação. Recorda-te que vais ter a oportunidade única da tua vida. Portanto, APROVEITA. E não te preocupes com o regresso, porque te vão acontecer tantas coisas (boas e más), que quando regressares vais ter uma perspectiva completamente diferente da que tens agora da vida, do mundo, das pessoas, do teu próprio país e, sobretudo, de ti.
Semanas depois, o André escreveu-me a carta que agora aparece, neste livro, na página 30, com o título “Viagem Adiada”. A viagem adiada em questão era a sua volta ao mundo. Eu respondi-lhe com a resposta mais evidente: “Faltou-te só… o primeiro passo”.
Recebo agora do André o convite para escrever umas linhas sobre este seu livro que relata “passinhos” que ele foi dando entretanto. Imagino a publicação do livro como a concretização de um sonho na vida do André. Como o seria na vida de qualquer um de nós. Vejo, pois, este livro como um segundo passo na sua “carreira” de viajante. Congratulo-me portanto com este teu segundo passo, companheiro. Esperando que agora se lhe siga, ao segundo, o primeiro… aquele que ainda te falta dar.
Gonçalo Cadilhe
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Livro “Livre Trânsito”
Esta viagem de volta ao mundo acabou por ser concretizada 3 anos mais tarde. As crónicas podem ser lidas no meu segundo livro, o “Livre Trânsito”.