Não resisto. Faço de conta que me engano no caminho e saio da auto-estrada antes de chegar ao fim. Faço o “rali” desde Messines pela estrada secundária bem escura e estreita que aumenta a sensação de velocidade. Só quando avisto o castelo ao longe é que levanto o pé.
Tantas vezes sonhei atravessar Silves à noite com a minha amada ao meu lado, para lhe mostrar o castelo iluminado e fantasiar sobre as batalhas que ali se travaram e sobre os homens que ali morreram pelo amor da sua princesa.
Mas, mais uma vez, hoje atravesso sozinho. Dantes, a visão do castelo dava-me força e coragem. Hoje nem o consigo olhar bem… atravessa-me um sentimento de raiva profundo e acelero ainda mais. Faço o resto da estrada até Porto de Lagos no máximo, a exigir tudo do pobre Corsinha que em breve vai embora, e só descanso quando me atravesso na curva de Odelouca.
Seria honrado morrer nas muralhas do castelo, a lutar uma batalha por uma causa perdida ou um amor impossível, como antigamente. Mas não aqui, sozinho, numa curva apertada de uma estrada secundária escura e estreita.
Abrando, ponho um CD, desligo o ar condicionado e abro o vidro para sentir o cheiro das laranjeiras.
Talvez não me engane outra vez e siga sempre, sem me desviar, pelas estradas que outros fizerem para mim. Talvez, assim, consiga ter algum sossego e nunca mais voltar a sonhar com o Castelo de Silves.
Junho, 2004
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UPDATE Março 2017
Não aprendi a lição e continuo a ir pela estrada secundária! :)