Apanhado na rede
Belize City, Belize
22 Maio 2007
O nome Belize deriva a palavra Maya “belkini”, que significará algo como “sobre águas pantanosas”. De facto, a cidade de Belize (Belize City) está edificada três metros abaixo do nível da água do mar e, além do canal que a atravessa, é possível identificar uma construção baseada em diques, muitos deles já secos.
Conhecido até há alguns anos como as Honduras Britânicas, desde os tempos em que os espanhóis concederam aos ingleses sucessivas licenças para exploração de madeira e outros recursos, o país acabou por adoptar orgulhosamente o nome da cidade principal depois de se tornar independente.
Na verdade, Belize já não é a capital do país mas sim Belmopan, ligeiramente mais para o interior e menos vulnerável aos efeitos dos furacões que, com alguma frequência, invadem aquela zona. É usual ler-se letreiros em igrejas e escolas que indicam “hurricane shelter”. A cerveja nacional, que não é grande coisa, tem como marca Belikin, mais uma derivação do antigo termo Maya.
É, pelo menos, esta a história que me vende o Rick, um local que se auto intitula de guia. Não confio no Rick. E não usei o termo “vender” por acaso. A primeira vez que ele me abordou foi pouco depois de ter chegado à cidade, quando dava os primeiros passos pelas ruas do centro. Veio-me com a lenga-lenga do costume: se precisava de alguma coisa, hotel, táxi, barco para os cayos, trocar dinheiro, etc. Disse-lhe que não, obrigado. Insistiu, perguntou onde estava a dormir, o que é que ia fazer a seguir. Desbobinou uma série de informação que me podia ensinar, porque era o melhor guia da cidade e tinha passado não sei quantos anos a estudar… e que não era bom para mim andar sozinho, blá, blá, blá. Não gosto deste tipo de abordagem. Não gosto de gente que tenta vender a banha da cobra e que mete demasiados floreados em coisas simples. Detesto o “discurso político” e zangava-me frequentemente com chefes ou colegas de trabalho que não iam directos à questão ou que me tentavam manipular com pseudo falinhas mansas. Sim, tenho um mau feitio do caraças!
Com educação e boa atitude caribenha consigo livrar-me do Rick, explicando que gosto de descobrir as coisas por mim e que viajo com um orçamento controlado que não me permite contratar guias. Mas, no final da tarde, o sacana apanha-me de novo! Tenta elogiar-me, admirando-se da minha desenvoltura em já andar a percorrer a cidade toda sozinho. Enganador do caraças! Cometo o erro de ser sincero e respondo-lhe que vou procurar um restaurante para comer qualquer coisa. Meu dito, meu feito! Claro que ele conhece um bom… e barato! E vem comigo e tudo, que é coisa que também detesto. Senta-se comigo à mesa, pede um burrito e uma Coca-Cola. Imito-o, não vou comer nada mais caro do que ele! Não tenho outra hipótese senão deixá-lo falar… e é então que ele me conta a história do nome do país. Estou a ver o filme todo que se vai passar a seguir, mas não tenho escapatória fácil e, assim como assim, ao menos aproveito para ouvir. De vez em quando deixa escapar que só lhe dou o que quiser, o que achar que vale a informação… e que, por exemplo, um alemão lhe deu 20 dólares (equivalente a 10 dólares americanos). Alerto-o, mais uma vez, que não procuro nem tenho orçamento para um guia e, mesmo que tivesse, gosto de acordar um valor ao inicio para não haver surpresas e porque é mais honesto. Que tenho todo o gosto que se sente à mesa comigo, como meu convidado, mas que não quero mais do que isso. Parece fazer de conta de não ouve.
Levantamo-nos e ele, finalmente, vai directo ao assunto. Faço cara feia de como quem diz “eu já sabia que íamos chegar aqui” e dou-lhe 10 dólares (5 dólares americanos) para a mão, dizendo que isso lhe pagará uma boa refeição no dia seguinte. Não lhe agrada, lamenta-se dos anos e do dinheiro que gastou a estudar mas que vai aceitar porque eu sou boa pessoa. No mesmo momento, quase como um acto de reflexo, arranco-lhe a nota da mão e começo eu a desbobinar e a dar-lhe na cabeça por todo o joguinho que ele andou a fazer. Não é uma situação desejável… não sei quem ele é ou deixa de ser, se tem algum parceiro a observar a cena, o que tem escondido no bolso da calças… mas, quando a razão me assiste, vou quase sempre até às ultimas consequências. É, muitas vezes, a minha sentença de morte.
Acabo por lhe devolver a nota, para que me deixe em paz e não se dirija mais a mim. “E ficamos por aqui, ok?”. Ele tem ainda a cara de pau de me convidar para comer um cachorro com os 10 dólares que lhe dei, como que a desculpar-se. Não há nada a fazer, não posso argumentar com idiotas. Felizmente, este episódio não foi suficiente para me pôr a andar logo no dia seguinte.
O Belize, para mim, é mais um ponto de passagem do que um destino mas revelou ter potencial para umas férias bem descontraídas e descansadas. É um país com locais de mergulho e fauna marinha fora de série, que Jack Cousteau explorou até à exaustão, e parece meio desencaixado do resto da América Central. Ao contrário dos restantes países à sua volta, cujo povo é hispânico e a língua oficial é o espanhol, aqui a população é generalizadamente negra, tipo rastaman, e fala-se um inglês caribenho muitas difícil de compreender.
O que, de facto, vale a pena conhecer são os cayos, aquelas ilhas magníficas com a água mais transparente em que já me banhei e cujo ambiente me fazem lembrar aquele anúncio à bebida Malibu! A vida faz-se sobre lanchas que atravessam de umas ilhas para as outras e com um vagar contagioso. Mais do que palavras, vejam as fotos de Caye Caulker e façam um zoom no Google Maps para tentarem perceber o que estou para aqui a dizer. Considerem uma combinação de Belize e Guatemala para umas próximas férias. Mas, já sabem: se encontrarem o Rick, ponham-se logo a milhas!